Santa Maria da Feira é, como
muitos outros concelhos, local de variadas e modestas colectividades, que
usualmente fazem do futebol o seu entretenimento desportivo.
A proximidade dos locais, acirra
as rivalidades, que se sadias, estimulam o jogo, e tornam-no entretido.
Nas proximidades da cidade da
Feira, existiu em tempos um clube de futebol, que assumiu o nome do lugar onde
se situava. Designou-se por Juventude Desportiva Os Amigos de Cavaco.
Mas este nome proporcionou muitos trocadilhos e narrativas, e um deles é
relatado num jornal da nossa praça, que aqui é relembrado, juntamente com um
“retrato” do clube, que a partir de 2010 deixou de se mostrar.
DNSPORT
Os Amigos do Cavaco' já não são
motivo de chacota política
por JÚLIO ALMEIDA, Aveiro 09 Maio 2008
O clube é anterior ao cavaquismo,
lembra o presidente da formação
A meio da década de 90, o
descontentamento popular com o rumo da governação da segunda maioria absoluta
do PSD era de tal ordem que a simples entrada em campo de uma equipa amadora de
futebol levava alguns adeptos mais críticos do estado do País a soltar a língua
com impropérios que não devem ser escritos.
O então presidente da Juventude
Atlética "Os Amigos do Cavaco", Armando Peixoto, já falecido, chegou
a queixar-se, meio a sério, meio a brincar, que o clube nas suas deambulações
desportivas era "prejudicado" pela quebra de popularidade do
primeiro-ministro de então.
Numa deslocação ao campo do FIDEC,
em Aveiro, com as duas equipas perfilhadas no centro do terreno para a habitual
saudação inicial, uma bancada em coro começou a gritar "Guterres,
Guterres!", em jeito de provocação com conotações políticas que deixavam
antever a vontade irreversível do eleitorado numa alternância democrática, como
se confirmou.
"A verdade é que somos
anteriores ao cavaquismo", ironiza o actual presidente do clube, José Luís
Santos, um bancário de 36 anos e antigo praticante de atletismo.
Não consta nestes tempos mais
recentes após a eleição do antigo chefe do Governo para a Presidência da
República, esquecidos os dissabores da parte final como primeiro-ministro, que
tenham voltado "as bocas" muitas vezes ouvidas no passado.
O Cavaco é um pequeno e muito
antigo lugar da freguesia de Santa Maria da Feira, que nos 70 fervilhava de
actividade associativa. A certa altura, os directores da Juventude Atlética
"Os Amigos do Cavaco", muito ligado ao atletismo, e o Futebol Cavaco
decidiram colocar de lado as rivalidades, levando à fusão de ambos com o nome
do primeiro a vingar adoptando-se como cores o azul, o branco e o amarelo.
Trinta anos depois, "Os
Amigos do Cavaco" continuam a ter como principal modalidade o futebol,
perderam o atletismo mas ganharam o cicloturismo.
A equipa de futebol sénior disputa
actualmente a "competitiva" Zona Norte da II Divisão Distrital da
Associação de Futebol de Aveiro, onde só o concelho da Feira tem sete
representantes. "Muitas vezes são jogos entre vizinhos, irmãos e amigos no
campo e nas bancadas", conta o presidente.
Após uma passagem pela III Divisão
distrital, assegurada que foi a manutenção, "a única equipa do escalão que
não paga prémios nem ajudas de custo" - como sublinha o jovem presidente
no cargo, há muito ligado ao clube - segue em nono lugar entre 16 equipas.
O plantel persegue agora o objectivo
de ficar acima do 5.º lugar, motivado pela promessa da direcção de oferecer
"um estágio" no final do campeonato.
"Isto não podia ser mais
amador", diz em jeito de brincadeira José Luís Santos, que tem
"apenas uma tristeza enquanto dirigente": o clube nunca ganhou
qualquer título de campeão, perdendo o troféu a época passada "por um
mísero ponto".
Jogadores e equipa técnica não só
nada recebem como ainda têm prejuízo "pelo simples gosto de jogar à
bola". "Pagamos os combustíveis e almoços quando é preciso",
conta o central Nuno, de 26 anos, que tem no plantel o seu irmão Luís, um
avançado que já teve de "marcar no duro" quando se defrontaram em
campos opostos.
Luís, tal como o irmão, trabalha
numa fábrica de solas, mas é também agente funerário e chega a fazer de coveiro
"quando é preciso".
O treinador Arlindo Reis, um
antigo guarda-redes amador que abandonou cedo a carreira devido a lesão, não
podia estar mais orgulhoso da sua equipa. "Tem sido excelente", diz,
elogiando "a união dos jogadores, que são um verdadeiro grupo de
amigos".
O bom ambiente é
"injectado" também pelo massagista, Agostinho Belinha, que perdeu um
braço num acidente de trabalho. "Brinca muito com a sua deficiência e
ilustra o espírito do clube", conta o presidente.
Esta época, "Os Amigos do
Cavaco" já viveram um momento épico. Há poucas jornadas atrás, em Abril,
no dérbi local com o Mosteirô, em casa do rival, os visitantes ganhavam por 0-1
e tudo corria bem. Aos 42 minutos, seria expulso um jogador do Cavaco e já ao
"cair do pano" para intervalo, de uma vez, o árbitro mostrou o cartão
vermelho a mais três.
Nos balneários, presidente e
equipa ainda ponderaram não voltar ao terreno de jogo, mas decidiram ir
defender a vantagem no campo. Contra todas as adversidades, o apito final chegou
sem alteração do marcador e os sete jogadores dos "Amigos" saíram
"como heróis e sob aplausos dos adeptos, inclusivamente os da casa",
relembra José Luís Santos.
As "mágoas" no clube são
extra desportivas. Sem campo próprio, é obrigado a pagar 500 euros por mês para
utilizar o excelente Complexo Desportivo do Feirense, onde treina e joga muito
condicionado, já que tem de dar prioridade aos escalões jovens e ao plantel
profissional do Feirense.
As poucas receitas que tem são
geradas pelo bar da sede e quotizações dos escassos 70 sócios pagantes.
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