Futebol Saudade

Desde que, há mais de 100 anos, se fez o primeiro campeonato de futebol em Portugal, que a "passerelle", que é a vida desportiva, viu desfilar milhares de clubes.
Uns ainda hoje existem, pujantes e vigorosos até, outros, embora perdendo protagonismo, ainda resistem. Mas muitos ficaram pelo caminho.
Passaram ao futsal, deixaram o desporto, ou fecharam mesmo as portas. É dos que partiram (e não só), que aqui vamos tentar deixar a memória.




sábado, 3 de julho de 2021

Porto - os clubes

Foi tão forte o entusiasmo, era tão aliciante o jogo, que “clubes” foi coisa que não faltou.
Qualquer fábrica ou fabriqueta, a que se juntavam os bairros operários que as circundavam, faziam aparecer “clubes”.

Em 1914, acabadinha de fundar a associação distrital, numa contagem superficial nos primeiros 3 meses do ano, no jornal O Primeiro de Janeiro, foi possível apurar 49 “clubes”.
A pretensão deles era competir, mas a sua singeleza rudimentar, aliada também à extrema penúria dos seus, fazia com que qualquer sítio servisse de campo de jogo.

Não foi o fenómeno devidamente retratado nos jornais da época, que dirigidos por velhos conservadores, ou até ministros da igreja, viam neles o Satanás, e vai de os marginalizar. Mais.
Por isso que pouco tenha chegado até hoje, pois até as associações de classe eram duma extrema e descuidada organização, que não preservou devidamente as memórias.

Anexamos um mapa dos primeiros 25 anos, que pretende retratar os clubes que faziam parte da associação de futebol, estando nela filiados. Embora nem todos competissem, a perspectiva de alguns deles era permitirem-se dispor de campo, alugado pelos que os detinham, circunstância que de outra forma só lhes deixava o espaço público para jogar. Mas aí não era nada fácil.
Em 1915, o Porto alugava o campo ao Salgueiros de então, a 15 tostões por jogo (e 2 por toalha!).

Os campeonatos da Liga Invicta, a Promoção, e até o Campeonato de Amadores, que acabou já nos anos 2 mil, todos têm uma matriz comum. Por alvo, os descamisados. Clubes sem campo. Sem campo, pela simples razão que não tinham meios para o aluguer de um qualquer lameiro, adaptável a campo, e que sobrevivesse á ganância dos senhorios. Ainda hoje há milhentos exemplos disso na cidade. O mais emblemático é o do Lima. 60 anos após o despejo, ainda as ruínas se lá conservam.

Mas o dia-a-dia dos primeiros anos, foi algo de febril. Surgiam grupos por todo o lado, a maioria numa penúria de todo o tamanho (basta ler sobre os jogos surrealistas de 3ªs e 4ªs categorias, onde os atletas se apresentavam com indumentárias variadas, de cores diversas, calças arregaçadas e presas por corda, e onde o pé descalço não era incomum! O futebol em toda a sua singeleza.

De tal modo foi este proliferar de clubes, a que a AF punha muitas restrições, mas que a torna incapaz de suster esta avalanche, que a leva a acolher uma organização surgida na cidade (1926), que visava dar guarida aos modestos clubes, que não dispunham de campo. Era a Liga Invicta.
Isto teve o efeito de motivar entusiasmos, e fazer aparecer muitos mais grupos. De tal ordem, que não restou outra solução que não fosse a triagem. Surge assim a obrigatoriedade de estes clubes apresentarem alvará. Este era passado pelo Governo Civil, e uma das cláusulas para o obter, era apresentar uma planta da sede!
As tascas, sedes “preferenciais” de muitos, ficaram logo de fora. Voltas deste extraordinário fenómeno social, que tem por personagens principais os “descamisados”


Em anexo um PDF caracterizador da realidade dos primórdios do futebol no distrito (AQUI)

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