Este clube é
dos heróicos tempo da baliza às costas. A sua saga de pioneiros, vale bem ser
contada. Com rigor e verdade.
Assim, sempre
será o primeiro campeão transmontano de futebol, ainda não havia Federação, mas
onde a então União de Futebol foi chamada a intervir. E decretar o Mirandela
campeão. Mas contemos a história em toda a sua extensão.
Os primeiros
vinte anos do século passado foram de grande frenesim com o futebol. Jogo
simples, de fácil apreensão e de custos reduzidos, depressa cativou as massas.
As feitas de carne e osso. Foi assim que o princípio de 1921 veio encontrar
gente de Mirandela, Valpaços, Bragança e Chaves empenhada em criar um
campeonato. E assim se fez, numa reunião em Mirandela. Um dos
clubes já dispunha de campo de jogos, e por isso o torneio teve ali lugar,
organizado pelo Flávia.
Foi no campo
do Flávia (Santo Amaro). Mas só Mirandela, Flávia e o União Bragançano se
aprestam a jogar, já que o Vila Real desiste.
Começa o
campeonato com o Flávia-Mirandela, que estes vencem por 2 a 0, o que torna difícil a
retirada dos vencedores, com os apaniguados de Chaves a tentarem tirar
desforço! Apaziguados os ânimos, joga-se no dia seguinte o Mirandela-União
Bragançano, mas estes apresentam-se com 3 jogadores do Flávia, o que leva
Mirandela a recusar-se a jogar. Reuniões feitas, e não se chegando acordo,
surge a sugestão de consultar a União de Futebol, e esta, do alto da sua
erudição, dá razão ao Mirandela, que se sagra Campeão Transmontano!
Mas a
experiência foi “traumatizante”, como agora se diz, e o campeonato não voltaria
antes de 1925. Foi quando o Mirandela se apresentou ao primeiro campeonato de
Vila Real, um distrito vizinho do seu, onde não havia clubes, campeonatos ou
jogos! Filiou-se em Janeiro de 1925, e disso dá conta o jornal Correio de
Mirandela (20 Fevereiro de 1925).
Mas vamos
falar deste Mirandela Foot-Ball Club, que foi o motivo deste post.
“A Causa” era
o título do seu órgão informativo, e que se publicou por 29 números, desde Julho
1922 até 1924, e donde pudemos recolher este rico historial do associativismo
concelhio.
Tudo começa em
1913, quando um oficial do exército, João Maria Alves Esteves (1), começa a
divulgar tal jogo. Seguem-se alguns anos de prática desgarrada e ocasional, até
que em 1917 surge uma equipa dos Empregados do Comércio. Esta foi logo
secundada por outra do Externato Mirandelense, que fazem então jogos frequentes
entre si. Um dia resolvem convidar uma equipa de Bragança, o União Bragançano,
e da junção das suas equipas, surge o Mirandela Foot-Ball Club, que se estreia
com uma vitória por 2 a
1. Mas também depressa o clube fica inactivo, e só em 1919 volta à actividade. Alugado
o antigo “Salão Drogas”, torna-se um clube eclético, com ginástica, bilhar,
pesos e halteres, e outras modalidades, mas sem futebol.
Entretanto em
Chaves procura-se criar uma federação de futebol, e após algumas reuniões toma
corpo o I Campeonato Transmontano. Joga-se em 1921 em Chaves, e o Mirandela FC
sagrar-se-ia campeão!
As peripécias
de tal competição estão amplamente retratadas no seu jornal (A Causa de 20
Agosto 1923, pg 1 a
6).
Após 2 anos
sem futebol, surgem novas direcções que se comprometem a reactivar o futebol, e
disso se tomará conhecimento, quando os treinos passam a ser ministrados por
João Alves todas as segundas-feiras, no “Stadium Marginal do Tua”, que devia
ser uma língua de areia suficientemente ampla, junto ao rio.
Filiado em Vila Real em 1925, toma
parte no seu I Campeonato Distrital, jogando em 22 de
Março, no campo do Calvário em
Vila Real , perdendo por 4 a 1 com o SC de Vila Real.
Foi a sua estreia no futebol oficial, mas também seria a
sua despedida. A partir daqui vem a decadência.
As competições
tinham lugar em Vila Real
e Chaves, e os custos eram, obviamente, um entrave, escasseando também o apoio
dos seus. Daí ao desânimo, foi um passo, e o clube desapareceu. Um jornal
local, o Acção Transmontana, faz mesmo uma proposta ao clube para se
reorganizar (28 de Maio e 11 de Junho de 1925), entregando a sede, poupando no
aluguer, e vendendo os bilhares. Poupando assim, talvez se pudesse reformar
convenientemente. Mas tal não sucede. Ressurgiria 4 anos depois, quando um
grupo de jovens pretendeu reabilitar o futebol em Mirandela (Correio de
Mirandela de 25 de Maio de 1929), reabilitando o velhinho Mirandela FC. Não
ressurge o clube, mas seria o impulso para que um novo aparecesse. Era o
Mirandela Sport Clube, fundado em 10 de Junho de 1929 (Imparcial de 30 de Abril
de 1930), e que até hoje se mantém firme no futebol nacional e de Mirandela, concelho
que apesar das suas 37 freguesias apenas em mais 2 se alcandorou a estes palcos
oficiais.
Mas neste
pioneirismo local, surgiram fenómenos relevantes que é curial citar, pois
diz-nos da apetência de algumas terras para o desporto. É o caso de Torre de
Dona Chama, que já então tinha uma equipa prestigiosa. O Cália Foot-Ball Club.
Mas também a
vila de Mirandela fez surgir outros entusiastas pelo jogo, e é assim que vimos
citados e deles soubemos de jogos, como o Foot-Ball Club Mirandelense “O
Artístico” (1921), e o Onze de Futebol Os Mirandelenses (1923).
Rematemos
estas memórias falando também daquilo que é essencial ao jogo: o campo. Não
ficam dúvidas que inicialmente foram as areias a servir de recinto, mas outros
baldios mais ou menos amplos também foram usados. O clube nas suas competições
oficiais (ou quase), sempre jogou fora. Vila Real e Chaves viram as suas
camisolas brancas e calções verdes passear-se por esses recintos. Já
internamente, vimos citado em 1923
a criação de uma comissão para a criação de um recinto
de jogo, mas nunca viria a concretizar-se no seu reinado. Mas terá jogado em
diferentes locais, pois assiste-se (1923) em algumas circunstâncias, à citação
do “campo da Boa Morte” e também ao “campo de S. Sebastião”, um baldio algures
em 1924.
Fica aqui uma
viagem a um passado longínquo, mas que encerra as origens do futebol de hoje
por aqui, e que os muitos jornais de Mirandela, vila Real, Bragança e Chaves,
para além de outros, nos contam. Partilhar o que li, é o objectivo derradeiro
deste blogue.
(1) – 20 Agosto de 1923
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